domingo, 17 de julho de 2011

Crianças cuidam de floresta na Bolívia



Crianças mostram com orgulho o mapa do bosque El Machetero, em Puerto Rico, Bolívia. Crédito : Herencia
“Às vezes eu entrava no mato com meus pais, mas era feio, dava medo”, diz Margarita Quete, menina de 12 anos da comunidade de Motacusal, “mas quando chegou o projeto BONI os pais e mães da comunidade se organizaram e nos deram um pedaço de floresta para que a gente o cuidasse, nos ajudaram a fazer as trilhas e agora já se pode andar por ai, porque ficou bonito e já não é perigoso”, explica.


Margarita se refere ao projeto BONI ou Floresta das Crianças (Bosque de los Niños, em espanhol), uma iniciativa concebida como uma estratégia de educação, desenvolvimento comunitário e conservação dirigida a crianças da área rural com o objetivo de revalorizar a floresta amazônica para sua conservação e manejo integral, ao mesmo tempo em que promove a consciência  comunitária. A iniciativa está baseada na entrega de um espaço de floresta às crianças para que elas o manejem e cuidem, voluntariamente, em sua totalidade.

O projeto foi iniciado em Bolívia no ano 2006 pela ONG Herencia através do Programa Amazônico Trinacional (PAT) Bolívia-Peru-Brasil, na comunidade de Curichón, dentro da Reserva Nacional de Vida Silvestre Amazônica Manuripi, e no ano 2008 a experiência foi replicada em Motacusal, onde mora a Margarita, e em outras comunidades amazônicas vizinhas. Atualmente existem seis Florestas das Crianças na região: Monterrey, Palacio, Motacusal e Irak em Bolívia; e Bélgica e Vila Primavera no Peru.

Floresta das Crianças


As crianças exercem cidadania através de reuniões entre eles e também com a comunidade, onde tomam decisões sobre sua floresta. Crédito: Herencia
O projeto quer fortalecer os elementos próprios da cultura indígena-campesina amazônica e relacioná-los com o bem-estar comunitário e a conservação dos bosques, indica a publicação “A Floresta das Crianças na Amazônia Boliviana, de Herencia e Care Bolívia”.

Segundo a publicação, a inspiração para o início do projeto foi o programa Terra de Crianças, executado no Peru pela ONG Ania, dirigido às crianças da zona rural, “com o fim de promover o desenvolvimento de valores e atitudes de responsabilidade social e ambiental”. Consiste em um espaço físico outorgado por longo prazo às crianças, onde eles são os protagonistas de sua utilização, valoração e cuidado, tanto de recursos naturais como culturais, e a seu desenvolvimento sustentável, e são reconhecidos por isso.

Já a Floresta das Crianças em Bolívia está orientada a empreender “uma educação que valore a vida construindo conhecimentos e habilidades em harmonia com a natureza”, mas não fica só na educação, explica Gilda Ticona, técnica da Herencia, mas também promove a pesquisa, o manejo de produtos florestais não madeireiros da mata, enfatiza  também o fortalecimento da cidadania.

Redução do desmatamento


Crédito: Herencia
De acordo com Gilda Ticona, através do BONI são promovidos diversos benefícios para as comunidades e assim para a Amazônia, como a conservação das florestas através do uso sustentável de seus recursos, a redução do desmatamento, a diversificação da produção não focada em um só produto. Já na parte social, é fortalecida a cidadania, preparando futuros líderes, que desde crianças já participam ativamente em sua comunidade. Em Motacusal, “inclusive as autoridades já se estão involucrando na metodologia, em sua aplicação, e assim a liderança comunitária e municipal da maior valor à riqueza que cada região tem”, afirma.

As melhoras são confirmadas por José Hurtado, assegurando que “a comunidade antes da criação da Floresta das Crianças não estava organizada, cada família fazia seu trabalho e atividades sem coordenação com as outras famílias”, até que começou o projeto, o que os ligou e os identificou como uma comunidade unida. Agora, toda a comunidade está envolvida, desde as mães, os pais, os professores, os dirigentes e as crianças.

De acordo com a técnica de Herencia, os próximos passos são a consolidação dos BONI nas comunidades que estão começando o processo, dando-lhes apoio e motivação, além da experiência aprendida anteriormente, “preparando as crianças e o pessoal para a autogestão e a continuação do projeto através da sustentabilidade”. Gilda acredita que esta sustentabilidade pode acontecer com o envolvimento das autoridades políticas e educativas, buscando a inserção do projeto nos orçamentos municipais, convertendo a metodologia em política educacional, e também pela venda dos produtos não madeiráveis produzidos na Floresta das Crianças.

Atualmente Motacusal, uma comunidade de 20 famílias parece haver se convertido na escola das Florestas das Crianças, conta Margarita Quete, a menina citada no começo desta reportagem: “Agora vem à nossa Floresta crianças de outras escolas e colégios para aprender o que nos fazemos, e assim nos temos mais vontade de mostrar nossa Floresta da Criança”, garante Margarita.

Segredo do sucesso


A Floresta das Crianças chega a ser um laboratório social educativo, além de um atrativo para os adultos da comunidade e outros visitantes. Crédito: Herencia
Segundo Juan Fernando Reyes, diretor da ONG Herencia, três são os elementos fundamentais da Floresta das Crianças: a autogestão, a gestão integral da floresta e o bem-estar coletivo. Ele explica que a autogestão promove nas crianças o pensamento comunitário, a capacidade de autogoverno e a coesão social, e “implica trabalhar e dar atenção às crianças da mesma forma como se da à adultos, e envolve-los (pais, mães, professores, autoridades) na Floresta das Crianças”.

Em Motacusal, por exemplo, as crianças representantes do BONI fazem parte da máxima organização local, a Assembleia Comunitária, e são ouvidos pelos adultos e pela comunidade em seus pedidos e considerações. “Nossas crianças sabem manejar seus próprios produtos e respeitar os seres vivos da floresta, e nos - os pais – aprendemos a valorá-los e obter seus recursos naturais sem lhe causar dano”, afirma José Hurtado, castanheiro e dirigente comunitário.

Já a gestão integral da floresta fomenta seu manejo como um todo, promovendo sua revalorização através do uso de seus recursos naturais. Conhecer e aprender a usar estes recursos ajuda a mudar a percepção sobre a floresta, afirma uma publicação da Herencia, além de promover segurança alimentar mediante hortas ou sistemas agroflorestais. O confirma o professor rural Santiago Jofré, que diz que teve a “experiência de aprender e ensinar sobre a importância da natureza”, e agora em seu BONI as crianças tem uma horta que plantaram com a ajuda de seus pais, e tem cupuaçu, mamão e frutas cítricas.

E através do bem-estar coletivo é promovida a convivência social, a relação ética com a vida e a solidariedade, como em espaços ou ações no BONI, como a sede social, a criação de hortas, a aplicação de um sistema de manejo de lixo, etc. Por meio destes elementos é que o BONI se mostra diferente dos modelos convencionais de desenvolvimento, unindo o desenvolvimento material e espiritual conseguindo uma relação harmônica entre as pessoas e a natureza.

Fonte: http://www.oecoamazonia.com/br/reportagens/bolivia/263-criancas-cuidam-de-floresta-na-bolivia

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Construção da usina de Belo Monte ameaça indígenas isolados

A presença de indígenas em isolamento voluntário na região dos rios Xingu e Bacajá tem sido descrita desde a década de 1970[1]. Há estudos e testemunhos que comprovam sua presença nas cabeceiras do Igarapé Ipiaçava e de um grupo isolado (ou grupos isolados) na Terra Indígena (TI) Koatinemo.  Belo Monte foi planejada para ser construída próxima às áreas de perambulação desses grupos de isolados.

Telma Monteiro

Uma representação sobre irregularidades no processo de licenciamento de Belo Monte foi entregue ao MPF do Pará no final de 2010. A construção foi aprovada pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI). Todas as instituições envolvidas no processo de Belo Monte poderão ser responsabilizadas pela extinção de povos indígenas em isolamento voluntário e pela destruição de terras indígenas.

Ameaças sérias colocam em risco a sobrevivência de indígenas em isolamento voluntário na Amazônia e chamam a atenção pelo descaso com que têm sido tratadas pelo governo brasileiro, pelas instituições financeiras e pelas empresas – públicas e privadas.  Em três dos maiores projetos do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) - nas hidrelétricas Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira e, agora, no projeto do Complexo Hidrelétrico Belo Monte, no rio Xingu[2] – esse descaso está ocorrendo.

O estudo do "Componente Indígena" de Belo Monte, entregue ao Ibama em abril de 2009, reconheceu a presença de indígenas em isolamento voluntário na cabeceira do córrego Igarapé Ipiaçava e na Terra Indígena Koatinemo dos Asurini[3]. O território de perambulação desses indígenas está localizado cerca de 70 km (em linha reta) do local onde está previsto o barramento principal da UHE Belo Monte, no sítio Pimental, na Volta Grande do Xingu.

O Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) de Belo Monte e suas complementações apresentaram apenas superficialmente a questão dos indígenas em isolamento voluntário e listaram dois grupos que ainda não foram identificados.  O Parecer Técnico FUNAI que analisou o Componente Indígena de Belo Monte[4] fez referência aos impactos[5] que poderiam afetar os isolados; a ação de grileiros e invasores atraídos pelas obras vai ameaçar sua integridade física e cultural.

No parecer, os técnicos da FUNAI alertaram para o fato de que o desvio das águas e a consequente redução da vazão do rio Xingu no trecho da Volta Grande poderia gerar efeitos em cadeia sobre a ictiofauna nas florestas marginais ou inundáveis; que o movimento migratório criaria aumento populacional na região e provocaria a pressão sobre os recursos naturais; que essa pressão levaria às invasões das terras indígenas onde perambulam os grupos de indígenas em isolamento voluntário[6].

Nas considerações finais e recomendações do parecer, a FUNAI concluiu que:

Apesar do EIA-RIMA apresentar uma extensa agenda de planos e programas, cujos objetivos são os de mitigar os impactos negativos do empreendimento sobre os povos e Terras Indígenas, a complexidade da situação, como foi retratada nesse parecer, baseado em informações colhidas pela Funai e no próprio EIA-RIMA, exige muito mais do que a implementação de um bom Plano Básico Ambiental (PBA). A situação atual da região, fortemente impactada por desmatamentos, atividade madeireira e garimpos, entre outros, com a presença insuficiente do Estado brasileiro, já contribui para o contexto de vulnerabilidadedas Terras Indígenas.”
“Nesse sentido, é imprescindível um conjunto de medidas (emergenciais e de longo prazo) de duas ordens: 1) aquelas ligadas ao poder Público; e 2) aquelas de responsabilidade do empreendedor”.

Uma das condicionantes da FUNAI pede que antes do leilão de compra de energia de Belo Monte, ocorrido em 20 de abril de 2010, o poder público deveria coordenar e articular ações para a proteção dos indígenas em isolamento voluntário. Para tal seria imprescindível a publicação de uma Portaria de Restrição[7] de Uso entre as Terras Indígenas Trincheira Bacajá e Koatinemo.

A despeito das evidências da presença de grupos de indígenas em isolamento voluntário, o processo de licenciamento de Belo Monte continuou célere e cercado de planos com estratégias que levaram à concessão da licença de instalação parcial ilegal da infra-estrutura de apoio - canteiro de obras.

Confirmação da presença de indígenas em isolamento voluntário

Em 2008 a presença de indígenas em isolamento voluntário foi confirmada conforme os relatos dos Asurini sobre seu encontro com isolados durante uma expedição de caça na cabeceira do Igarapé Ipiaçava. Segundo Fábio Ribeiro[8] da FUNAI de Altamira e do líder Apewu Asurini, da aldeia Koatinemo, no Xingu (vídeo), os Asurini avistaram indivíduos em perambulação.  Gravações com os depoimentos do encontro dos Asurini com os indígenas em isolamento voluntário foram levados à FUNAI. 

Em 2009 a FUNAI iniciou as análises dos impactos da UHE Belo Monte, sobre as terras indígenas. A Coordenação de Índios Isolados (CGII) decidiu empreender uma expedição à área informada pelos Asurini e acabou encontrando, também, sinais claros de invasão de não-índios.

A FUNAI deu encaminhamento à referência de indígenas em isolamento voluntário para que fosse incluída no EIA da UHE Belo Monte, uma vez que o território de perambulação está na área de influência. A FUNAI decidiu que era necessário isolar a área que está fora da Terra Indígena demarcada e assim evitar a pressão dos assentamentos nas proximidades de Altamira.

Foi traçada uma linha reta virtual isolando a área de perambulação dos isolados para que se tornasse futuramente uma Terra Indígena. Isso protegeria os indígenas em isolamento voluntário de possíveis contatos, criaria uma identificação da área de perambulação e propiciaria a proteção do entorno.

A minuta da Portaria de restrição foi então preparada e ficou aguardando mais de um ano a análise da Procuradoria Jurídica da FUNAI. Essa área fora de terras indígenas demarcadas é uma das últimas áreas intactas de floresta na proximidade de Altamira.

A Portaria de Restrição[9] de Uso nº 38, de 11 de janeiro de 2011, entre as Terras Indígenas Trincheira Bacajá e Koatinemo, na verdade, estabeleceu apenas a restrição ao direito de ingresso, locomoção e permanência de pessoas estranhas aos quadros da FUNAI, na área descrita na Portaria, pelo prazo de dois anos a contar de sua publicação. A vigência da portaria expirará antes sequer do término das obras da usina de Belo Monte, se ela viesse a ser construída.

O leilão de Belo Monte, no entanto, ocorreu em 20 de abril de 2010 sem que a condicionante sobre a portaria de restrição de uso entre as Terras Indígenas Trincheira Bacajá e Koatinemo, que visava proteger os indígenas em isolamento voluntário, tivesse sido cumprida. A portaria só foi publicada no DOU em 12 de janeiro de 2011.

As obras de Belo Monte já iniciaram sob licença ilegal concedida pelo Ibama, o Governo do Estado do Pará deu continuidade a um projeto de concessão florestal na área protegida e abriu licitação para sua exploração por empresas madeireiras. Um território sob concessão florestal impede a proteção[10] dos indígenas em isolamento voluntário. Eles continuam seriamente ameaçados.



[1] AHE Belo Monte Estudos de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), páginas 103/111/113, Componente Indígena PROCESSO IBAMA n° 02001.001848/2006-75, abril de 2009.
[2] Leia mais sobre as ameaças à sobrevivência dos indígenas isolados na Amazônia.
[3] Idem, p. 103.
[4] UHE Belo Monte – Componente Indígena Parecer técnico nº 21/CMAM/CGPIMA-FUNAI.
[5] Parte 4 – Avaliação Geral dos Impactos Socioambientais nas Populações Indígenas, p. 87.
[6] “A continuidade e possível intensificação dessa ocupação por não-índios colocará em risco a integridade física dos grupos isolados, sendo necessária a interdição da área e as devidas ações de fiscalização. Em setembro de 2009 a Funai enviou outra expedição para a região com o mesmo objetivo de identificar a presença dos isolados, mas ainda não obtivemos as informações com os resultados dessa nova tentativa.” p. 86, UHE Belo Monte – Componente Indígena Parecer técnico nº 21/CMAM/CGPIMA-FUNAI.
[7] “1) Medidas ligadas ao Poder Público, a serem implementadas em diferentes etapas: a) Ações até o leilão: 3. Publicação de portaria para restrição de uso entre as Terras Indígenas Trincheira Bacajá e Koatinemo, para proteção de índios isolados”; UHE Belo Monte – Componente Indígena Parecer técnico nº 21/CMAM/CGPIMA-FUNAI, ps. 95/96.
[8] Link do vídeo com os depoimentos de Apeu Asurini da TI Koatinemo, no rio Xingu e Fabio Ribeiro, da FUNAI de Altamira, sobre os indígenas em isolamento voluntário  BELO MONTE threatening voluntarily isolated indigenous groups ! October 15, 2010, 05:38 AM  http://www.youtube.com/watch?v=DOGMpcUXSEI
[9] “1) Medidas ligadas ao Poder Público, a serem implementadas em diferentes etapas: a) Ações até o leilão: 3. Publicação de portaria para restrição de uso entre as Terras Indígenas Trincheira Bacajá e Koatinemo, para proteção de índios isolados”; UHE Belo Monte – Componente Indígena Parecer técnico nº 21/CMAM/CGPIMA-FUNAI, ps. 95/96.
[10] Link do vídeo com o depoimento de Walter A. da Silva, FUNASA, Altamira, sobre os riscos que correm os indígenas na região   http://www.youtube.com/watch?v=iEq70whdLPQ.

terça-feira, 31 de maio de 2011

ESCLEROFILIA E TEORES DE FÓSFORO E NITROGÊNIO EM Epidendrum huebneri Schltr. (ORCHIDACEAE), EPÍFITA DE UMA CAMPINA DA AMAZÔNIA CENTRAL



Catarina Ágata Santos PEREIRA(1); Luís Carlos de Matos BONATES(2).
(1)Bolsista PIBIC/FAPEAM ; (2)Orientador CPBO/INPA).


1. Introdução
Objetivou-se neste trabalho fornecer subsídios que contribuam para o entendimento das estratégias de ocupação e sobrevivência no ecossistema de Campina por espécies de orquídeas amazônicas. Lleras (1978) chama  a atenção para o uso dos termos escleromorfismo e esclerófita, salientando que os mesmos não devem ser usados como sinônimos de xeromorfismo ou xerófita. Etimologicamente, estes termos são de origem grega e skleros significa duro, rígido e botanicamente designa estruturas com alto conteúdo de tecido de sustentação e xeros significa seco, árido e morpho, forma, padrão. Temos assim que, escleromorfismo ou esclerofitismo, designa características estruturais e que xerofitismo, indica adaptações ecológicas. Dickison (2000) reporta que folhas escleromorfas também são encontradas em muitas plantas lenhosas de pântanos. Também informa o fato de que à ocorrência relativamente comum da esclerofilia em muitas monocotiledôneas e dicotiledôneas tem sido relacionada a folhas de longa vida, que por sua vez, seriam adaptações à limitação de nutrientes ou também uma forma de tornar as folhas impalatáveis para os animais. A esclerofilia pode ser causada por fatores como a oligotrofia, que resulta em uma baixa produtividade orgânica assim como, pela toxidade de uma grande quantidade de alumínio no solo (Goodland 1971) ou então, pela severa deficiência em elementos organogênicos, principalmente nitrogênio e fósforo (Loveless 1962; Nordenkampf 1987; Medina & Cuevas 1994; Benzing 1990; Larcher, 2000). 

2. Material e Métodos

O estudo foi realizado com material botânico coletado na Reserva Biológica de Campina do INPA-SUFRAMA, BR 174, km 45, entre 20 30' 00“ de latitude Sul e 60 00' 00” de longitude Oeste altitude de 44 metros sobre o nível do mar (Ribeiro & Santos, 1975). Foram utilizadas 15 folhas adultas coletadas de cinco indivíduos para a análise morfo-anatômica e fisiológica. Os indivíduos foram anteriormente submetidos a uma hidratação até o ponto de saturação. Após a poda, as folhas foram imersas em água para manter o seu estoque hídrico e transportadas para o laboratório para aferição dos seguintes parâmetros: massa fresca (MF) foliar e massa seca (MS) foliar - foram obtidas pela pesagem das folhas saturadas e secas; Área foliar específica (AFE), calculada com planímetro a partir do molde das folhas frescas; Índice de esclerofilia foi determinado, calculando-se a área foliar específica e relacionando-a com a massa seca e a área da superfície foliar fresca (Marín & Medina, 1981); Grau de Suculência foi medido pela relação entre a massa fresca do limbo foliar completamente hidratada e sua superfície foliar seca (Delf, 1911). Os teores nutricionais foliares foram analisados na EMBRAPA pelo método - digestão ácida – quente: Nitrogênio – N - H2SO4 + sais + catalizadores e digestão ácida - quente: HNO3 + HClO4. (Malavolta et alli, 1997).
3. Resultados e discussão
Índice de esclerofilia - O limbo foliar apresentou um alto índice de esclerofilia (51,29 cm2/g -1). O valor apresentado se insere dentro da faixa estimada por Medina et alli.,(1978) para a vegetação  esclerófila da Amazônia que é em torno de 26 a 60 cm2/g -1 e próximo do valor médio de 59,9 cm2/g -1 que foi calculado por Klinge (1985) para AFE de espécies lenhosas de campina amazônica. Segundo Marín & Medina (1981), a AFE correlaciona-se positiva e significativamente com a concentração foliar de N e P.; Grau de suculência - Foi de 1,09 g/dm2 onde este valor representa 81% (MF-MS) da massa foliar fresca saturada (1,16 g) sendo este percentual considerado alto. Conforme Bonates (2007), E. huebneri  possui o metabolismo CAM utilizado como via alternativa ao C3. O mesmo autor registrou a presença para a espécie de uma suculência morfo-anatômica foliar que é caracterizada pela presença de tecido armazenador de água e solutos envolvidos por barras de espessamento de lignina e que as suas raízes possuem velames. Essas características fazem parte do mecanismo de estocagem de água que resulta na consequente suculência em órgãos de orquídeas; Teor de nitrogênio da massa foliar seca - Foi de 1,1% sendo considerado baixo quando comparado com as concentrações adequadas de N para as plantas estipuladas por Epstein (1972) que é de 1,5 %. Walker (1991) reporta que sob um suprimento pobre de N, o carboidrato excedente não utilizável no incremento do crescimento é estocado em forma de amido e substâncias graxas ou desviado para a síntese de lignina, que é um dos componentes de espessamento das paredes celulares. O espessamento acentuado é uma das características do escleromorfismo; Teor de fósforo da massa foliar seca - Foi de 0,10 % que é considerado baixo quando comparado com as concentrações adequadas de P para as plantas que é de 0,20 % (Epstein,1972). Os baixos teores de P em plantas podem ser usados como indicativos para considerar uma planta esclerofila. Para Loveless (1962) o conteúdo deverá ser menor que 0,30% e Marín & Medina (1981), menor que 0,08% do peso seco foliar. Medina et al. (1990) e Sobrado & Medina (1980) interpretam a esclerofilia como uma resposta da planta a substratos oligotróficos e com grande variação no nível de água. Plantas esclerófilas seriam bem adaptadas a tais ambientes porque tem um metabolismo que funciona em baixos níveis de P e N e por possuírem uma estrutura foliar que presumivelmente reduz ou tolera a perda de água. A estrutura esclerófila não seria necessariamente uma adaptação para seca, mas, provavelmente, uma seleção para ambientes pobres. Isso evidencia o relato de vários autores de que as esclerófilas podem ganhar predominância em solos deficientes em P não só em áreas úmidas, mas também xéricas, como no caso das campinas amazônica.

4. Conclusão
As folhas coriáceas das orquídeas, além da atividade fotossintética, atuam também como órgãos de reserva de água e de ácidos carboxílicos. A escleromorfia detectada no limbo foliar de orquídeas que vegetam em campinas amazônicas, que são ambientes xéricos, está diretamente relacionada ao oligotrofismo nutricional e/ou ao xeromorfismo habitacional e a herbivoria e ao fato de que as esclerofilas são “fitoplásticas”, ou seja, plantas adaptáveis a uma ampla gama de condições. O grau de esclerofilia seria regulado por síndromes adaptativas que respondem aos estímulos gerados pelo hábito epifítico primário e/ou pseudoterrestre secundário.

5. Referências

BENZING, D.H. 1990. Vascular epiphytes. General biology and related biota. Cambridge University Press. New York. 354p.

BONATES, L.C.M. 2007. Anatomia Ecológica da folha e da raiz e aspectos ecofisiológicos de Orchidaceae epífitas de uma Campina da Amazônia Central, Brasil. Tese de Doutorado em Ciências Biológicas, área de concentração em Botânica. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia/Fundação Universidade do Amazonas, Manaus, Amazonas. 497p.

DELF, E. M. 1911 Transpiration and behaviour of stomata in halophytes. Ann. Bot. 25: 485 – 505.

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MALAVOLTA, Eurípedes; VITTI, Godofredo Cesar; OLIVEIRA, Sebastião Alberto de. – 1997. Avaliação do estado nutricional das plantas. Princípios e aplicações - 2ª Edição.

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