terça-feira, 31 de maio de 2011

ESCLEROFILIA E TEORES DE FÓSFORO E NITROGÊNIO EM Epidendrum huebneri Schltr. (ORCHIDACEAE), EPÍFITA DE UMA CAMPINA DA AMAZÔNIA CENTRAL



Catarina Ágata Santos PEREIRA(1); Luís Carlos de Matos BONATES(2).
(1)Bolsista PIBIC/FAPEAM ; (2)Orientador CPBO/INPA).


1. Introdução
Objetivou-se neste trabalho fornecer subsídios que contribuam para o entendimento das estratégias de ocupação e sobrevivência no ecossistema de Campina por espécies de orquídeas amazônicas. Lleras (1978) chama  a atenção para o uso dos termos escleromorfismo e esclerófita, salientando que os mesmos não devem ser usados como sinônimos de xeromorfismo ou xerófita. Etimologicamente, estes termos são de origem grega e skleros significa duro, rígido e botanicamente designa estruturas com alto conteúdo de tecido de sustentação e xeros significa seco, árido e morpho, forma, padrão. Temos assim que, escleromorfismo ou esclerofitismo, designa características estruturais e que xerofitismo, indica adaptações ecológicas. Dickison (2000) reporta que folhas escleromorfas também são encontradas em muitas plantas lenhosas de pântanos. Também informa o fato de que à ocorrência relativamente comum da esclerofilia em muitas monocotiledôneas e dicotiledôneas tem sido relacionada a folhas de longa vida, que por sua vez, seriam adaptações à limitação de nutrientes ou também uma forma de tornar as folhas impalatáveis para os animais. A esclerofilia pode ser causada por fatores como a oligotrofia, que resulta em uma baixa produtividade orgânica assim como, pela toxidade de uma grande quantidade de alumínio no solo (Goodland 1971) ou então, pela severa deficiência em elementos organogênicos, principalmente nitrogênio e fósforo (Loveless 1962; Nordenkampf 1987; Medina & Cuevas 1994; Benzing 1990; Larcher, 2000). 

2. Material e Métodos

O estudo foi realizado com material botânico coletado na Reserva Biológica de Campina do INPA-SUFRAMA, BR 174, km 45, entre 20 30' 00“ de latitude Sul e 60 00' 00” de longitude Oeste altitude de 44 metros sobre o nível do mar (Ribeiro & Santos, 1975). Foram utilizadas 15 folhas adultas coletadas de cinco indivíduos para a análise morfo-anatômica e fisiológica. Os indivíduos foram anteriormente submetidos a uma hidratação até o ponto de saturação. Após a poda, as folhas foram imersas em água para manter o seu estoque hídrico e transportadas para o laboratório para aferição dos seguintes parâmetros: massa fresca (MF) foliar e massa seca (MS) foliar - foram obtidas pela pesagem das folhas saturadas e secas; Área foliar específica (AFE), calculada com planímetro a partir do molde das folhas frescas; Índice de esclerofilia foi determinado, calculando-se a área foliar específica e relacionando-a com a massa seca e a área da superfície foliar fresca (Marín & Medina, 1981); Grau de Suculência foi medido pela relação entre a massa fresca do limbo foliar completamente hidratada e sua superfície foliar seca (Delf, 1911). Os teores nutricionais foliares foram analisados na EMBRAPA pelo método - digestão ácida – quente: Nitrogênio – N - H2SO4 + sais + catalizadores e digestão ácida - quente: HNO3 + HClO4. (Malavolta et alli, 1997).
3. Resultados e discussão
Índice de esclerofilia - O limbo foliar apresentou um alto índice de esclerofilia (51,29 cm2/g -1). O valor apresentado se insere dentro da faixa estimada por Medina et alli.,(1978) para a vegetação  esclerófila da Amazônia que é em torno de 26 a 60 cm2/g -1 e próximo do valor médio de 59,9 cm2/g -1 que foi calculado por Klinge (1985) para AFE de espécies lenhosas de campina amazônica. Segundo Marín & Medina (1981), a AFE correlaciona-se positiva e significativamente com a concentração foliar de N e P.; Grau de suculência - Foi de 1,09 g/dm2 onde este valor representa 81% (MF-MS) da massa foliar fresca saturada (1,16 g) sendo este percentual considerado alto. Conforme Bonates (2007), E. huebneri  possui o metabolismo CAM utilizado como via alternativa ao C3. O mesmo autor registrou a presença para a espécie de uma suculência morfo-anatômica foliar que é caracterizada pela presença de tecido armazenador de água e solutos envolvidos por barras de espessamento de lignina e que as suas raízes possuem velames. Essas características fazem parte do mecanismo de estocagem de água que resulta na consequente suculência em órgãos de orquídeas; Teor de nitrogênio da massa foliar seca - Foi de 1,1% sendo considerado baixo quando comparado com as concentrações adequadas de N para as plantas estipuladas por Epstein (1972) que é de 1,5 %. Walker (1991) reporta que sob um suprimento pobre de N, o carboidrato excedente não utilizável no incremento do crescimento é estocado em forma de amido e substâncias graxas ou desviado para a síntese de lignina, que é um dos componentes de espessamento das paredes celulares. O espessamento acentuado é uma das características do escleromorfismo; Teor de fósforo da massa foliar seca - Foi de 0,10 % que é considerado baixo quando comparado com as concentrações adequadas de P para as plantas que é de 0,20 % (Epstein,1972). Os baixos teores de P em plantas podem ser usados como indicativos para considerar uma planta esclerofila. Para Loveless (1962) o conteúdo deverá ser menor que 0,30% e Marín & Medina (1981), menor que 0,08% do peso seco foliar. Medina et al. (1990) e Sobrado & Medina (1980) interpretam a esclerofilia como uma resposta da planta a substratos oligotróficos e com grande variação no nível de água. Plantas esclerófilas seriam bem adaptadas a tais ambientes porque tem um metabolismo que funciona em baixos níveis de P e N e por possuírem uma estrutura foliar que presumivelmente reduz ou tolera a perda de água. A estrutura esclerófila não seria necessariamente uma adaptação para seca, mas, provavelmente, uma seleção para ambientes pobres. Isso evidencia o relato de vários autores de que as esclerófilas podem ganhar predominância em solos deficientes em P não só em áreas úmidas, mas também xéricas, como no caso das campinas amazônica.

4. Conclusão
As folhas coriáceas das orquídeas, além da atividade fotossintética, atuam também como órgãos de reserva de água e de ácidos carboxílicos. A escleromorfia detectada no limbo foliar de orquídeas que vegetam em campinas amazônicas, que são ambientes xéricos, está diretamente relacionada ao oligotrofismo nutricional e/ou ao xeromorfismo habitacional e a herbivoria e ao fato de que as esclerofilas são “fitoplásticas”, ou seja, plantas adaptáveis a uma ampla gama de condições. O grau de esclerofilia seria regulado por síndromes adaptativas que respondem aos estímulos gerados pelo hábito epifítico primário e/ou pseudoterrestre secundário.

5. Referências

BENZING, D.H. 1990. Vascular epiphytes. General biology and related biota. Cambridge University Press. New York. 354p.

BONATES, L.C.M. 2007. Anatomia Ecológica da folha e da raiz e aspectos ecofisiológicos de Orchidaceae epífitas de uma Campina da Amazônia Central, Brasil. Tese de Doutorado em Ciências Biológicas, área de concentração em Botânica. Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia/Fundação Universidade do Amazonas, Manaus, Amazonas. 497p.

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LLERAS, E. 1978. Aspectos básicos da morfologia e anatomia das folhas e sua relação com parâmetros fisiológicos. Anais do II Cong. Lati-Ameri. Botânica. Brasília. Brasil.

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